quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012



"Confesso que tenho uma certa queda por sotaques".





Néé!

  E eu estava lá de novo, no nosso lugar preferido, ou ao menos era antes de tudo isto acontecer, antes de eu não poder dormir um único dia sem pensar em você, antes de quando meu choro era por machucados externos e não no coração. E agora eu estava lá me martirizando por você de novo, eu pensava em como tudo isso foi acabar assim, em como eu e você nos auto destruímos, em como nossa incrível amizade foi se transformar nessas terríveis migalhas de atenção que um espera receber do outro. Eu queria que tudo isso não tivesse acontecido desse jeito, eu queria que naquele dia você não me deixasse partir tão cedo, que você ao menos segurasse minha mão e falasse que tudo valeu a pena porque foi por mim e me pedisse pra ficar, mas você só partiu deixando toda essa dor imensa que eu não sabia que podia existir, agora ela me perturba todos os dias, todos os infelizes 85 dias que passei sozinha desde que partiu. Agora você é algo dentro de mim que me tortura e me dói todas as vezes que te olho e sei que não posso tocar em você, todas as vezes que você foge deixando apenas as frações de amor que você consegue compartilhar, me deixando apenas com aquela esperança de que algum dia nos ainda vamos ser. Será que um dia você irá deixar de partir?
  E eu estava de novo naquele lugar. Naquele bar horrível que nos conhecemos,  onde estavamos afogando nossas magoas e que não sei porque cargas d'água fomos trocar nossas primeiras palavras, nosso primeiro olhar, aquilo foi o começo de uma grande ruína. Mas como toda ruína, aquilo também foi algo bonito e resistente até você decidir que tudo que eu tinha a te oferecer não era o bastante para você. E depois...você voltou, várias vezes, provando pra gente que tudo sempre iria dar errado mas que mesmo assim, mesmo sabendo que no final você partiria, eu tinha uma certeza dentro de mim que poderiamos ser. E agora essa certeza já tinha quase se extinguido, depois de você partir de novo e levar contigo toda a minha esperança, toda essa minha certeza. Por isso eu estava ali de novo, tentando recuperar alguma partícula de esperança que você tenha deixado em mim...
 - Pensando muito, Kate? - Uma mão encosta em meu ombro e sinto arrepios por todo o meu corpo, nem preciso me virar para ter a certeza que é você, só você consegue essa reação de mim, e é incrível como isso nunca passa como se algo dentro de mim realmente acreditasse que vale a pena preservar algumas coisas.
- Eu nunca paro paro de pensar...
Eu estava mentindo, e você sabia disso. Porque você me conhece, acredita que é assim quando estou contigo, que meu cérebro simplesmente não funciona, que não consigo pensar em nada com você do lado, que minhas razões, meus sentidos não são muito coerentes. Na verdade não são nada coerentes.
Então você me olha, como que me escaneando, vendo como estava tudo que você deixou pra trás.  E você dá aquele seu sorriso, aquele sorriso de lado que diz que gosta do que está vendo,  e então eu sinto meu coração doer novamente. 
 -  Porque você está aqui ? - Ele me pergunta se sentando no banco ao meu lado- Pelo que me lembre você não era muito de gostar desses lugares.
 - Você se foi faz muito tempo...as pessoas mudam.
 ( Silêncio)
Olho para minha bebida, pensando no porque de tudo isso estar acontecendo agora. E ainda precisava dele, não sei porque mas eu ainda necessitava do seu toque, da sua voz sussurrando a noite no meu ouvido, precisa do sua mão na minha...agora.
- E porque você está aqui, Henrique?
Ele olha pra porta, pensando que talvez ele não deveria nunca ter entrado ali de novo, deveria ter fugido do desejo que teve ao vê-la lá sentada ali.
- Por você...
- Não. É por você, sempre foi só por você. Nunca fui eu, você sempre me procura só porque a sua necessidade te enlouquece e quando ela se ameniza um pouco, você foge.
- Se você soubesse... - Você diz em sussurro quase inaudível.
- Olha, Henrique,  eu precisei tanto de você, eu sempre precisei... mas você nunca estava lá. E depois de tantas idas e vindas, toda vez que você resolve dar o ar de sua presença, sabe, parece que a distância nunca existiu. Mas você sempre a acha de volta e eu fico lá chorando por você, necessitando você...então chega uma hora em que a gente desiste. E a minha já chegou.
Você olha para mim, não está mais sorrindo, você percebe que não vai ser tão fácil dessa vez.
 - Sabe, as vezes eu fico pensando... você leva a vida com rédeas curtas.
 - E o que isso quer dizer?
 - Que tem medo daquilo que não consegue controlar. E nós somos exatamente isso, somos irracionais juntos, não conseguimos controlar tudo que vem a tona quando ficamos perto o suficiente um do outro, e talvez por isso não dê certo, ou talvez por isso dê. Quem sabe não é a gente que foge disso tudo. Quem sabe a gente devesse simplesmente parar de fugir.
 Ele arrasta sua mão pelo balcão e pega minha mão, entrelaçando nossos dedos. Olho para aquilo e começo a acreditar de novo. Porque uma só vez na vida eu não posso ser feliz, eu não posso arriscar sem pensar nas consequências, porque eu não poderia me atirar nos braços dele agora e aproveitar os sorrisos enquanto eles existirem?
 - A gente foge disso tudo por um motivo, porque não é pra ser, Henrique.
 - Errado, a gente foge disso tudo porque a gente tem  medo de dar certo, medo de ser feliz, medo de nos perdemos um no outro...temos medo de de confirmarmos esse nosso próprio medo. 
 (Silêncio)
 - Henrique, porque você sempre tem que tornar as coisas tão difíceis?
 - Porque nada na vida é fácil, muito menos eu e você, nos somos várias coisas mas essa palavra: fácil, não é uma coisa da qual nos enquadramos.
 Pela primeira vez na noite concordamos em algo, fácil  não é uma palavra que nos define, fomos tudo, fomos ignorantes, fomos sádicos , fomos incompletos, fomos destroçados... só não fomos fácil. Talvez estivesse na hora...
 Você então se levanta, chega mais perto de mim, sinto o cheiro daquele seu perfume, aquele que me perturbava em todos os lugares em que percorria e olha nos meus olhos. Vejo seu seus olhos escuros percorrerem todo o meu rosto em busca de algo, paralisa seu olhar então na curva dos meus lábios, se inclina em minha direção, meu coração dispara, então você se desvia e sussurra em meu ouvido:
 - Dance comigo, Kate.
 Só então reparo em tudo a minha volta, nos casais dançando abraçados... e finalmente presto atenção na música...aquela música, a nossa música, a música que combinava perfeitamente com nos dois, que por algo inexplicável nos conectava. 
 Fomos arrastados pela música, minha mão pousava em seu ombro, enquanto a sua me puxava contra seu corpo, me empurrando cada vez mais pra perto. Ficamos então perdidos um no outro... com a canção que dizia:


...And in the night we`ll wish this never ends

 We`ll wish this never ends...

Talvez quem sabe tudo fosse fácil dessa vez... afinal.

-T.



       Eu vivo num mundo em que as pessoas exigem sinceridade mas espalham mentiras pelos 4 ventos, eu vivo em um mundo em que as pessoas se escondem atrás de ironias para se protegerem, eu vivo em um mundo em que as pessoas não tem mais coração...matam sem piedade, eu vivo em um mundo em que o amor é apenas uma palavrinha bonita que todos querem encontrar um dia, eu vivo em um mundo em que as pessoas não pensam antes de agir e depois acham que pedir desculpas resolve tudo, eu vivo em um mundo em que pessoas se machucam, se cortam, em um mundo onde pessoas tiram sua própria vida...vivo em um mundo onde viver sem dor é anormal. Vivo em um mundo onde ser correto é para os fracos, onde os ricos tem privilégios e aos pobres só restam suas prisões...vivo em um mundo onde a liberdade é apenas uma ilusão da humanidade, onde vários acham que mandam mas não sabem coordenar sua própria vida... vivo em um mundo onde a maioria dos pessoas já estão mortas por dentro e nem sabem.
Vivo em um mundo onde viver é impossível.
-T.


Saio do chuveiro com meu cabelo molhado, pego minha toalha automaticamente, nem ao menos reparo nos minhas mãos que percorrem meu corpo e chegam aos meus cabelos loiros...meus pensamentos estão longe, faço sem perceber uma viajem ao meu passado, vendo tudo que me levou até ali, faço uma inventario dos meus pequenos momentos, das minhas lágrimas abundantes, dos meus sorrisos incontroláveis, das minhas ironias, dos meus sarcasmos, dos meus amores imbecis... do meu eu incorrigível.
Atravesso o corredor  em direção ao meu quarto, coloco minha camisa velha de flanela e me enfio debaixo das cobertas...
E então eu pensamento corre rapidamente em direção a você e tudo em mim começa a doer em uma fração de segundos. Eu não acredito no que fiz comigo, no que fiz contigo... eu distanciei a coisa que mais importava pra mim. E porque ? 
Talvez seja por causa dessa mania idiota que eu tenho de provar pra mim mesma que eu posso suportar tudo, até mesmo a tua ausência e dor que ela provoca... 
Talvez seja para provar que eu ainda sinto algo aqui dentro, que eu ainda consigo sentir algo que não seja um vazio...
Eu não sei mais o que fazer. Essa saudade toda me corroí noite e dia, ela é insuportável,  ela me  persegue por todos os lugares... mas eu gosto dela, eu procuro por ela também... parecemos até duas pessoas que se repulsam mas que são atraídas diariamente por um imã imaginário que não sei porque tenho incerteza de chamar de amor.
Lembro então do seu sorriso, do seu sotaque, do seu toque na minha mão, dos seus lábios nos meus... e a saudade aperta mais forte todo o meu corpo. Sinto as lágrimas escaparem e escorrerem pelo meu rosto, nada mais posso fazer...
Parece que a saudade é a única coisa que me prende ainda à você.
-T.